SACRAMENTOS DE CURA: CONFISSÃO E A IGREJA PRIMITIVA PARTE 02
AS CONSTITUIÇÕES APOSTÓLICAS DO SÉCULO IV
Como na Tradição Apostólica de Santo Hipólito, as constituições apostólicas escritas na Síria no século IV incluem uma oração similar a oração do bispo:
“Dá-lhe, Senhor Todo-Poderoso, através de Cristo, a participação em teu Espírito Santo, para que tenha o poder de perdoar os pecados de acordo ao Teu preceito e Teu comando, e desate todos as ataduras, qualquer que seja, de acordo com o poder que Tu outorgou aos Apóstolos” (Constitução Apostólica, VIII).
SANTO AMBRÓSIO DE MILÃO (340-396 D.C.)
Padre e doutor da Igreja, nascido no ano 340 e consagrado bispo em 374. Foi também um ardente defensor da ortodoxia contra o Arianismo. Morreu no ano 397. Em 387 d.C., batizou Santo Agostinho de Hipona. Fez-se popular pela firmeza de que deu provas em 390 d.C. diante do imperador Teodósio, a quem proibiu o acesso a suas Igrejas depois da matança em Tessalônica, até que o imperador fizesse penitência pública.
Compôs entre 384 e 394 d.C. o De Paenitentia, que é um tratado não homilético em dois livros, nos quais Ambrósio refuta as afirmações dos novacianos acerca do poder da Igreja de perdoar pecados e facilita informações de particular interesse para conhecer a prática penitencial da Igreja de Milão no século IV.
“Professam mostrando reverência ao Senhor, reservando só a Ele o poder de perdoar pecados. Maior erro ele não poderia cometer ao buscar rescindir as Suas ordens derrubando o ofício que Ele mesmo conferiu. A Igreja o obedece em ambos os aspectos, ao ligar o pecado e ao desliga-lo; por que o Senhor quis que ambos os poderes fossem iguais” (De poenitentia, I, ii, 6).
Ensina que este poder é uma função do sacerdócio e que este pode perdoar todos os pecados:
“Pareceria impossível que os pecados devam ser perdoar através penitência; Cristo outorgou este (poder) aos apóstolos e dos apóstolos foi transmitido ao ofício dos sacerdotes” (De poenitentia II, ii, 12).
O poder de perdoar se estende a todos os pecados:
“Deus não faz distinção; Ele prometeu misericórdia para todos e a Seus sacerdotes outorgou a autoridade para perdoar sem nenhuma exceção” (De poenitentia I, iii, 10).
SANTO ATANÁSIO
Santo Atanásio também escreve:
“Assim como o homem batizado pelo sacerdote é iluminado pela Graça do Espírito Santo, assim também aquele que em penitência confessa seus pecados, recebe através do sacerdote o perdão em virtude da graça de Cristo” (Fragmentum contra Novatum, PG XXVI, 1315).
SANTO AGOSTINHO DE HIPONA (354-430 d.C.)
Bispo de Hipona e doutor da Igreja, é reconhecido como um dos quatro doutores mais distintos da Igreja latina, ao lado de São Jerônimo, Santo Ambrósio e São Gregório Magno. Nasceu em 354 e chegou a ser bispo de Hipona durante 34 anos. Combateu duramente todas as heresias de sua época e morreu no ano 430.
Escreve contra aqueles que negam que a Igreja recebeu o poder de perdoar os pecados:
“Não vamos ouvir aqueles que negam que a Igreja de Deus tem o poder de perdoar todos os pecados”.
“Quando você for batizado, mantenha uma vida boa nos mandamentos de Deus para que você possa preservar o seu batismo até o fim. Que eu não digo que você vai viver aqui sem pecado, mas eles são pecados veniais que esta vida nunca está sem. O Batismo foi instituído para todos os pecados. Para pecados leves, sem os quais não podemos viver, a oração foi instituída... Mas não cometa esses pecados por conta de que você teria que ser separado do corpo de Cristo. Pereça o pensamento! Para aqueles que você vê fazendo penitência cometeram crimes, seja adultério ou algumas outras enormidades. É por isso que eles estão fazendo penitência. Se seus pecados eram leves, a oração diária bastaria para apagá-los... Na Igreja, portanto, existem três maneiras em que os pecados são perdoados: nos batismos, na oração, e na maior humildade de penitência” (Sermão aos Catecúmenos sobre o Credo 7:15; 8:16).
“Um abcesso havia se formado em sua consciência; ele o atormentado e não lhe deu nenhum descanso... Confesse, e na confissão deixe o pus sair e escoar” (Comentário sobre Salmo 66, 6).
“Eu percebo o que a incontinência pode dizer: (...), que se um homem, acusando a esposa de adultério, mata-la, este pecado, pois ele está acabado e não perdura nele [isto é, desde que ele não continue a cometê-lo], se ele é cometido por um catecúmeno, é absolvido no batismo, e se for feito por quem é batizado, é curado por penitência e da reconciliação” (Casamentos adúlteros 2:16:16).
A Crença de Agostinho na penitência (e da necessidade do batismo e da Eucaristia) coloca uma sentença de morte na opinião de que ele ensinou o Sola Fide.
“No entanto, aqueles que fazem penitência de acordo com o tipo de pecado que eles cometeram, não fiquem desesperados para receberem a misericórdia de Deus na Santa Igreja, para a remissão de seus crimes, porém graves” (Echiridian 17, 65).
“Iniquidade, no entanto, por vezes, faz tal progresso nos homens que, mesmo depois de terem feito penitência e após a sua reconciliação com o altar eles cometem os mesmos pecados ou mais graves... E apesar de que o lugar da penitência na Igreja, não lhes é concedido, Deus não vai ser esquecido de sua paciência em relação a eles (...)” (Cartas 153, 3, 7).
“Há aqueles que diriam que nenhuma penitência está disponível para certos pecados; e eles falam que eles devem ser excluídos da Igreja e feitos hereges. A Santa Madre Igreja não é impotente a qualquer tipo de pecado” (Sermões 352, 9).
SÃO JOÃO CRISÓSTOMO
Também são João Crisóstomo mostra claramente que já em seu tempo 15 séculos atrás, tinha plena certeza do poder dos sacerdotes perdoarem os pecados:
“Fosse loucura manifesta para condenar tão grande poder, sem a qual não podemos nem obter o céu nem receber o cumprimento das promessas... Não apenas quando eles (os sacerdotes) nos regeneraram (batismo), mas também depois de nosso novo nascimento, eles podem perdoar nossos pecados” (De sacra., III, 5).
“Os sacerdotes receberam um poder que Deus não deu nem aos anjos nem aos arcanjos. Foi dito a eles: 'Tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares, será desligado. Governantes temporais têm realmente o poder de ligação, mas eles só podem ligar o corpo. Sacerdotes, em contraste, podem ligar com um vínculo que pertence à própria alma e transcende os próprios céus. Será que [Deus] não lhes dar todos os poderes do céu? ‘De quem você deve perdoar pecados’, diz ele, ‘são-lhes perdoados; cujos pecados você retiver, são retidos’. Que maior poder há do que isso? O Pai entregou todo o julgamento ao Filho. E agora eu vejo o Filho colocando todo esse poder nas mãos dos homens [Mat. 10, 40, João 20, 21-23]. Eles são criados para esta dignidade como se eles já estivessem reunidos para o céu” (O Sacerdócio 3, 5).
Pode haver testemunhos mais claros do que esses, se a Igreja criou a confissão e a absolvição no concílio de Latrão IV em 1215, por que será que 800 anos antes deste mesmo concílio São João Crisóstomo, faz tais declarações?
SÃO JERÔNIMO
São Jerônimo é categórico em falar que é necessário a confissão e a penitência:
“Se a serpente, o diabo, morder alguém secretamente, ele infecta essa pessoa com o veneno do pecado. E se o que foi mordido se manter em silencio e não fizer penitência, e não quiser confessar sua ferida... então seu irmão e mestre, que tem a palavra [de absolvição] que vai curá-lo, não pode o ajudar muito bem” (Comentário sobre Eclesiastes 10, 11).
SÃO PACIANO, O BISPO DE BARCELONA
Em 390 d.C. Escreve a respeito do perdão dos pecados:
“Isso que tu dizes, só Deus pode perdoar. Bastante certo: mas quando o faz através de seus sacerdotes é Ele que faz com Seu próprio poder” (Epistola I ad Simpron, 6 em P.L., XIII, 1057).
SÃO CIRILO DE ALEXANDRIA (447 d.C)
Também este ilustre doutor da Igreja escreve:
“Homens cheios do Espírito de Deus (isto é. sacerdotes) perdoam pecados de duas maneiras, tanto pela administração do batismo a aqueles que merecem ou pelo perdão do filho penitente da Igreja” (In Joan., 1, 12 em P.G., LXXIV, 722).
CONCLUSÃO
Estas evidências mostram que a Igreja sempre teve a consciência plena de haver recebido de Cristo o poder de perdoar os pecados e considera este como parte do depósito de fé. Surpreendentemente tanto os padres do oriente como do ocidente interpretam as palavras de Cristo tal como nós católicos fazemos quase vinte séculos depois. É evidente, portanto, que o concílio de Trento somente fez eco do que a Igreja já ensinava contra os hereges dos primeiros séculos, os quais, em sua grande maioria, nem sequer defendia a posição protestante de hoje, já que a grande maioria deles não rejeitava que a Igreja havia recebido tal poder.
fonte: ARRAIZ, José Miguel. Os Pais da Igreja e a confissão.
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